Face à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV 2 e da doença do Covid 19, tornou-se imperativo estabelecer medidas excecionais e temporárias a adotar para dar resposta às dificuldades que foram surgindo, nomeadamente no acesso aos tribunais e ao cumprimento dos prazos.
Nesse sentido, surgiu a Lei 1-A/2020 de 19 de março que estabeleceu um conjunto de medidas de caráter urgente, nomeadamente e no que respeita à suspensão dos prazos de prescrição e caducidade, previu o artigo 7º n.º 3 que “A situação excecional constitui igualmente causa de suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade relativos a todos os tipos de processos e procedimentos.” e no n.º 4 que “O disposto no número anterior prevalece sobre quaisquer regimes que estabeleçam prazos máximos imperativos de prescrição ou caducidade, sendo os mesmos alargados pelo período de tempo em que vigorar a situação excecional.”. Este artigo foi revogado pela Lei 16/2020 de 29 de maio, sendo que a suspensão dos prazos operou entre 09 de março e 03 de junho de 2020.
No entanto, devido ao agravamento da situação epidemiológica, os prazos de prescrição e caducidade vieram a ser, uma vez mais, suspensos no presente ano através da Lei n.º 4-B/2021 de 01 de fevereiro, sobretudo no seu artigo 6º-B n.º 3 onde refere – “São igualmente suspensos os prazos de prescrição e de caducidade relativos a todos os processos e procedimentos”, revogado, posteriormente, pela Lei n.º 13-B/2021 de 5 de abril. Com efeito, os prazos foram suspensos de 01 de fevereiro a 05 de abril de 2021.
O Prof. Marco Carvalho Gonçalves in “Atos Processuais e Prazos no âmbito da pandemia da doença Covid-19” defende que – “a situação excecional constituía igualmente causa de suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade que fossem relativos a todos os tipos de processos e procedimentos, isto é, aos prazos de prescrição e de caducidade que dissessem respeito ao exercício de direitos em juízo. É o que sucedia, por exemplo, com o prazo de caducidade de 30 dias para a dedução de embargos de terceiro, com o prazo de prescrição de três anos, no âmbito da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos, ou com o prazo de um ano para o exercício dos direitos de eliminação dos defeitos, redução do preço, resolução do contrato ou indemnização no âmbito da empreitada.”
No mesmo sentido, o Código Civil prevê a suspensão dos prazos de caducidade, no seu artigo 328º, referindo que – “O prazo de caducidade não se suspende nem se interrompe senão nos casos em que a lei o determine”.
Assim, e seguindo o entendimento do Prof. Marco Carvalho Gonçalves que, por força da adoção do regime excecional que a lei determina, a contagem dos prazos de prescrição e caducidade ficou suspensa nos períodos referidos, e entende-se que são prolongados pelo mesmo período em que vigorou a exceção.
Por sua vez, Luís Meneses Leitão, Bastonário da Ordem dos Advogados in CEJ – Estado de Emergência – Implicações na Justiça, (pág. 72), refere que – “A primeira dúvida que se coloca é se esse regime se aplica apenas em relação aos prazos para instaurar ações ou procedimentos que evitem a prescrição e a caducidade ou se abrange também prazos para o exercício extrajudicial de direitos legais ou contratuais. Uma vez que o que está em causa é a dificuldade de recurso aos tribunais nesta fase, entendemos que se trata apenas da primeira situação.”
A título de exemplo, o Acórdão da Relação de Évora, no processo n.º 114/19.3T8RMR.E1 de 25 de março de 2021 determinou que – “A suspensão de prazos processuais, a que se reporta o n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19/3, alterado pela Lei n.º 4-A/2020, de 6/4, aplica-se ao prazo de deserção da instância.”
Também o Tribunal da Relação de Lisboa entendeu que – “A suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade contemplada nos nºs 3 e 4 do artigo 7º da Lei n.º 1-A/2020, de 2020-03-19, que ocorreu entre 9 de março de 2020 e 3 de junho do mesmo ano, aplica-se ao prazo prescricional contemplado no nº 1 do artigo 337º do Código de Trabalho/2009.”, no processo n.º 2072/20.2T8CSC.L1-4 de 24 de março de 2021.
Afigura-se primordial e correto o acolher deste entendimento, pois está em causa uma situação excecional provocada pela ainda pandemia, que deu origem a um conjunto de alterações e medidas que foram adotadas de forma a suprir as dificuldades que surgiram no acesso aos Tribunais e à justiça, e que, inevitavelmente, provocou consequências a nível da vida em sociedade que teve de se moldar às alterações profundas impostas, o que deu origem, no plano do direito, a que muitos dos cidadãos e interessados adiassem a procura de fazer valer os seus direitos, por desinformação, pelas medidas adotadas no plano de contingência mais rigoroso nesses períodos, que os impossibilitaram de agirem da forma pretendida, não podendo, no nosso entender, virem a ser prejudicados pela prescrição e caducidade dos prazos, num período em que nada podiam fazer.